Por Rodrigo Mammana.
A Ibravin e a Vinhos do Brasil promoveu um evento focado nos espumantes do Hemisfério Sul no dia 25 de abril. Para o evento foram convidados alguns dos principais jornalistas da área para compor o juri, além de nomes de peso do cenário internacional tais como Patricio Tapia, Dirceu Vianna MW e Steven Spurrier, um dos mais conceituados jornalistas de vinhos do mundo. Foram também convidados formadores de opinião para degustarem os vinhos do painel.
A degustação ocorreu em um formato não convencional, gerando diversas críticas quanto à metodologia empregada que para muitos foi bastante confusa. Os vinhos foram divididos em duas baterias, a primeira somente de vinhos elaborados pelo método de tanque ( Charmat) e a outra sob o método tradicional. Apesar de não sabermos os rótulos, nos passavam o país de procedência de cada vinho, não se tratando assim de uma degustação totalmente às cegas. O número de amostras de cada país também não era igual, o que dificultava ainda mais chegar a qualquer conclusão. Não se sabia o preço dos vinhos nem o critério que deveríamos avaliar. Também nos foi informado que o intuito não era uma competição e então não haveria um campeão.
Painel Charmat:
Os primeiros três vinhos foram argentinos: Norton Extra Brut, um vinho levemente cítrico bastante discreto e simples; Trivento Brut, mais complexo e com notas de frutas brancas e boa acidez; Lagarde Altas Cumbres Brut, com aromas delicados, pouca fruta e bom frescor.
De maneira geral os vinhos argentinos foram apontados como os mais desequilibrados e sem expressão, recebendo poucos elogios. Os juízes acharam que faltou frescor nos exemplares desse país.
Dos três Charmat brasileiros, o primeiro foi o Chandon Brut com aromas pronunciados de frutas cítricas, acidez elevada com bom equilíbrio e persistência. Em seguida veio o Giacomin Brut, com aromas de cúrcuma e notas florais ( segundo Dirceu Vianna são flores de acácia). Vinho seco de acidez média e um pouco curto. O último brasileiro foi o Cordelier Brut, da Vinícola Fanti. Com aromas de cravo, especiarias doces e leves notas citrinas, possui uma boca mais complexa, frutada e com boa mousse. Muito bom.
O primeiro chileno foi o Santa Carolina Brut, um vinho com claras notas aromáticas de frutas tropicais (maracujá) e pêssego. Boa intensidade. Em boca é bastante encorpado e frutado, com acidez média e boa mousse. Deu a impressão das uvas terem amadurecido além da conta, fazendo com que apesar da boa complexidade ficasse um pouco desequilibrado. A maioria dos juízes não gostou do vinho. O segundo exemplar do Chile foi o Concha y Toro Brut. Vinho de perlage muito intensa, aromas delicados com notas de pinho e resina. Apesar de deixar a desejar no nariz, o vinho em boca se apresentou muito complexo, longo e fresco. Ótima acidez, bastante equilibrado. O último chileno foi o Santa Helena Premium Brut. Aromas de borracha branca sem complexidade. No palato é longo, intenso e bastante frutado. Spurrier achou que o vinho não tinha charme.
O único exemplar da Nova Zelândia foi o Sileni Estates Brut. De coloração dourada intensa apresentou aromas bastante complexos de laranjas passas com leves notas oxidativas ( agradáveis para alguns, condenadas por outros). Boca complexa com notas de laranjas, mel e amêndoas, bastante longo. O vinho foi muito polêmico, tendo o Dirceu como um dos que gostaram muito, dizendo que houve uma evolução oxidativa positiva, porém não intencional. Os juízes acharam que o vinho ficou muito tempo em garrafa, daí essas notas, entretanto não era esse o objetivo do produtor. Spurrier disse que um consumidor normal acharia que o vinho passou do ponto.
O único exemplar da África do Sul foi o Nederburg Cuvée Brut, um vinho bastante correto com presença de aromas de autólise e boca bastante equilibrada. Bom vinho.
Os preferidos do Dirceu foram o Silene, o Santa Helena e o Norton. Já Steven Spurrier teve como preferidos o Cordelier, Giacomin e o Norton. A minha preferência foi pelo o da Nova Zelândia, o Santa Helena e o Chandon .
Painel Método Tradicional:
O primeiro argentino foi o Luigi Bosca Brut Nature, um vinho com leves notas de leveduras, com boca elegante e complexa e boa persistência. Achei o vinho excelente, já o Spurrier disse que faltou sofisticação. O segundo foi o Kaiken Sparkling Brut, um vinho de visual palha claro esverdeado, aromas de frutas brancas, boa acidez e ótima mousse. Vinho muito bem feito e equilibrado, e segundo Spurrier se trata de um bom vinho para acompanhar comida. O último argentino foi o Trapiche Brut, vinho com média complexidade boa fruta em boca e notas amanteigadas. Muito bom. Steven Spurrier achou o vinho “ duro”.
O único exemplar australiano foi o Angas Brut. Visual palha claro, aromas delicados de pêssego e abacaxi, levedura quase que imperceptível. Boca complexa com acidez bastante elevada, muito bom.
O primeiro brasileiro foi o Miolo Milesime, com aromas não muito complexos e leve nota animal. Na boca é equilibrado, acidez média com leve residual de açúcar. Spurrier o classificou como “ aperitive wine”e gostou muito do vinho. O brasileiro seguinte foi o Valduga 130. Com um visual amarelo palha brilhante, aromas bastante elegantes com notas de peras e levedura bastante presente. Em boca é refinado, elegante, longo e fresco. Excelente. Spurrier achou o vinho “ elegant, citrous and charming”. Dirceu Viana considerou os brasileiros bastante consistentes sem serem “ forçados”. O terceiro brasileiro foi o Cave Geisse Blanc de Blancs. Palha claro com perlage muito intensa, apresentou aromas simples com notas cítricas e pouca levedura. Boca de média complexidade, boa persistência e um final de boca um pouco incômodo.
O único exemplar do Chile foi o Tarapaca Traditional Brut. Perlage intensa, aromas pronunciados de maracujá e “ fumaça”, tostados. A boca é potente com muita fruta. Trata-se de um estilo mais condizente com os charmat onde se preza a fruta e não se busca a complexidade derivada do contato com as leveduras. Vinho bom, entretanto unidimensional.
O exemplar da Nova Zelândia foi o Hunters Brut, um vinho palha claro com perlage finíssima. Aromas com presença de leveduras, brioche. Delicado e elegante, excelente acidez, longo, fresco e complexo. Final de boca muito agradável, ótimo vinho.
O último vinho era o único exemplar da África do Sul, o Krone 2007. Dourado intenso, perlage fina, apresentou aromas bastante complexos com claras notas oxidativas. Aparentemente ficou muito tempo em garrafa. Boca equilibrada e complexa, excelente final de boca e acidez na medida. Achei o vinho muito bom, porém a maioria se incomodou com as notas oxidativas e o condenaram.
Os preferidos de Spurrier foram o Neo Zelandês, o Valduga e o Cave Geisse. Os meus preferidos foram o Sul Africano, o Valduga e o Neo Zelandês.
Em sua palestra, Steven Spurrier falou um pouco sobre os espumantes de cada país do Hemisfério Sul e seus mercados. Em sua opinião o espumante brasileiro deve tentar conquistar mercado Europeu através de Wine Bars, servindo em copos de maneira descompromissada, sem a intenção de tratá-lo com algo muito sério como um Champagne. Nesses locais as pessoas estão abertas a provar novos e diferentes produtos. Ele também acha importante que o Brasil consolide uma marca para seus espumantes, de uma maneira que as pessoas conheçam bem a “ cara” do espumante brasileiro sabendo exatamente o que haverá dentro da garrafa. Dirceu Viana concorda que é necessário formar uma marca, definir bem um estilo para o “ Brazilian Sparkling Wine”, de uma forma que o consumidor o identifique assim como o faz com os Cavas e Proseccos, por exemplo.
Polêmicas e insatisfações à parte, ao meu ver o evento foi bom para o Brasil pelo fato de nomes fortes como o de Spurrier e Dirceu Viana terem gostado de nossos produtos Provavelmente Steven Spurrier fará alguma referência sobre nossos vinhos na importante revista Decanter, o que poderá melhorar nossa imagem. Como muitos falaram eu preferia que a prova tivesse sido totalmente às cegas e com critérios de seleção de rótulos bem definidos.
Percebo que hoje em dia ninguém ( ou quase ninguém) mais fica insistindo na bobagem de comparar os nossos espumantes com os champagnes e estão percebendo que temos um estilo próprio. Em minha opinião o espumante brasileiro deve ser festivo, fresco e alegre, assim como a imagem que o mundo tem de nosso país.